domingo, 6 de novembro de 2011

Filme “O Informante” traz fortes questionamentos sobre a ética versus os lucros

O Informante (1999) foi baseado em fatos reais / Foto: Divulgação

Frustração com as relações empresariais e políticas, falta de ética, sentimento de impotência e a sensação de que mudar o mundo é quase impossível. São essas as emoções que emergem dentro de cada um ao assistir O Informante (The Insider), longa metragem dirigido por Michael Mann que conta a história de um produtor de programa de televisão e de um cientista recém demitido de uma das sete maiores empresas de tabacaria dos Estados Unidos.
A reação é ainda mais drástica se o telespectador for um jornalista, que tem como base profissional o comprometido com a verdade, a integridade, a moral e a credibilidade. Esses valores entram em conflito, a todo instante, com a busca do lucro nos negócio, seja da rede de televisão, seja da indústria tabagista.
Jeffrey Wigand (Russel Crowe), pesquisador da tabacaria Brown & Williamson (B&W), descobre em um experimento científico que a nicotina – substância tóxica usada na produção dos cigarros – é, de fato, viciante e usada indiscriminadamente, pela indústria tabagista, para viciar seus consumidores.
Ao expor para seus superiores os resultados da pesquisa e a sua posição contrária à conduta da empresa, o pesquisador é demitido e persuadido a assinar um termo de confidencialidade que o impediria de falar quaisquer detalhes sobre o seu trabalho.

Russel Crowe interpreta o cientista Wigand, que descobriu os malefícios da
nicotina na produção do cigarro / Foto: Divulgação
O cientista se mostra decidido a cumprir o pacto de sigilo, mas sua consciência fica pesada por guardar um segredo que poderia mudar a vida de milhões de pessoas em todo o planeta. É nessas condições psicológicas que o produtor do programa 60 minutes, Lowell Bergman (Al Pacino), da rede americana de televisão CBS, encontra o pesquisador e o convence a revelar a história.
Ficção? Não, realidade. O roteiro foi inspirado no escândalo de 1993 que levou a indústria do tabaco a pagar mais de US$ 246 trilhões em indenizações nos Estados Unidos.
O filme mostra como o segredo industrial, criado com o objetivo de garantir aos investidores os lucros decorrentes das inovações tecnológicas e a proteção do negócio contra a concorrência, pode esconder informações essenciais à população.
Em quase todos os países existem normas de proteção às empresas que permitem o sigilo de informações. No Brasil, a questão é tratada no art. 195 da Lei 9.279/96, que "considera crime o ato de quem divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos, informações ou dados confidenciais, utilizáveis na indústria, comércio ou prestação de serviços, excluídos aqueles que sejam de conhecimento público ou que sejam evidentes para um técnico no assunto, a que teve acesso mediante relação contratual ou empregatícia, mesmo após o término do contrato; ou divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos ou informações a que se refere o inciso anterior, obtidos por meios ilícitos ou a que teve acesso mediante fraude".
A problemática levantada leva o espectador a pensar sobre quantos outros funcionários que trabalham com questões polêmicas, como as usinas nucleares ou o petróleo, são obrigados, por lei, a permanecer calados diante de informações que deveriam ser reveladas ao público.
Apesar da questão do sigilo industrial aparecer com bastante ênfase na história, o foco do filme revela-se nos bastidores da TV CBS, que também passa a ser ameaçada pela B&W.
A rede televisiva era conhecida pelo compromisso com a ética, com a verdade e com a credibilidade que transmitiam os seus jornalistas. Contudo, os valores da empresa se rmostraram questionáveis no momento em que ela estava prestes a ser vendida e qualquer percalço com a justiça poderia acarretar na perda dos compradores.
Portanto, o departamento jurídico da CBS resolve boicotar o depoimento do cientista e não publicar sua denúncia, não demonstrando importância nem com o trabalho do produtor em convencer Wigand a falar nem com as consequências que o cientista já estava sofrendo por ter revelado fatos tão alarmantes.
A controvérsia de uma rede comprometida em revelar a verdade ao escolher não exibir as imagens, por acarretarem implicações financeiras, deixa o público tenso ao constatar que o jornalismo também faz parte de uma indústria e esconde os seus segredos.

 O produtor Bergman (Al Pacino) convence o cientista a revelar os segredos da

indústria tabagista americana / Foto: Divulgação

 

“Você é um negociante ou um jornalista?” pergunta Bergman a Christopher Plummer (Mike Wallace), âncora do programa, olhando para a câmera como se estivesse falando com os telespectadores. O questionamento mexe com o público, que sai do filme com uma mistura de sentimentos de satisfação, pela qualidade cinematográfica; de angústia, pela realidade mostrada; e de revolta, pelos valores invertidos.

 

O longa, exibido em 1999, recebeu diversas indicações a prêmios do cinema, (sete ao Oscar, cinco ao Globo de Ouro, melhor ator no BAFTA, melhor filme no BODIL) e foi o vencedor da Satellite Awards nas categorias de melhor diretor e de melhor filme-drama.